Exercício crítico #1 – Contra as notas

Síndrome de impostor é quando você não se sente competente o suficiente para fazer determinada coisa. Bom, para ser sincero, quando pensei em começar essa série esse foi um dos meus pensamentos. Quem sou eu para falar de crítica de cinema? Tem tantos outros críticos melhores que eu e que não fazem isso. O que eu tenho para falar sobre isso? Sendo, novamente sincero, eu não sei. Mas cá estou eu, ignorando esses pensamentos e dando início a série “Exercício Crítico”, que vai buscar refletir sobre alguns temas sobre esse prática que tanto gosto de fazer.

Antes de iniciar alguns avisos: eu não tenha a pretensão de ensinar aqui alguma coisa, afinal para mim não existe um método crítico – calma, voltaremos a isso algum dia – e muito menos definir o que é a crítica de cinema. O que eu busco aqui é abrir diálogos, trazer inquietações e quem sabe proporcionar alguns debates.

Se essa série proporcionar debates e trocas de ideias ela vai ter atingido o seu objetivo.

É impossível eu não referenciar aqui a inspiração para essa série que se inicia agora, os textos do importante crítico brasileiro Luiz Zanin, que obviamente fala com mais credibilidade na sua série “A Arte da Crítica“. Eu recomendo muito que quem se aventura nesse exercício leia essa série dele.

As notas

Uma nota em um filme não é algo novo e nem nasceu com o advento da internet. Na mídia tradicional já existiram bonequinhos, estrelas e os próprios números que colocam um valor quantitativo em uma determinada obra. Mas, afinal, como colocar em números – ou em estrelas – um filme? Isso é algo que me inquieta.

Um crítico de cinema tem que entender a linguagem de cinema. Temos que entender o que são planos, o que é a montagem, a importância de uma profundidade de campo, ferramentas de roteiros entre outras coisas. Mas é justo avaliar isso em números? Têm momentos que me parece que algumas pessoas fazem como uma avaliação de escola de samba e tem um caderninho onde colocam “Montagem nota…10” “Trilha sonora nota…6” e no final fazem uma média com todas as notas e enfim chegam a um veredito. O que isso diz sobre o filme? Para mim, nada.

Colocar uma nota em um filme me parece apenas reduzir ele. O que quer dizer um filme nota 10? E um nota 5? Pior, o que significa um filme nota 8.4? Alguns podem dizer que o texto que acompanha a nota pode explicar a nota, mas se o texto explica a nota, qual o motivo da nota? Não seria mais fácil deixar apenas o texto? Qual a necessidade de quantificar o filme? É claro que algumas pessoas vêem o crítico como uma espécie de um guia, indicando quem e o que assistir, mas ainda assim isso não justifica a necessidade de uma nota.

Um filme sempre está inserido na lógica de mercado, mas o crítico não pode e não deve se resumir a isso. A crítica tem que refletir um filme pelo que ele é, se essa reflexão ajudar ou não na divulgação é outra coisa, foge do nosso poder. Se um crítico escreve um texto pensando em como isso vai impactar na divulgação, talvez seja melhor repensar o conteúdo que ele está criando.

Existem ótimos conteúdos na internet de filmes com notas, mas talvez precisamos repensar esse pensamento qualitativo.

Euller Felix

Cientista Social, pesquisador e crítico de cinema. Um dos Organizadores dos livros "O Melhor do Terror dos anos 80" e "O Melhor do Terror dos anos 90", ambos publicados pela editora Skript.

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