Um dos filmes que sempre é citado quando se fala na história do cinema é o “O Nascimento de Uma Nação” de D.W Griffith. O bom é que em todos os cursos que eu participei e que citaram esse filme, sempre foi destacado o quanto o filme é problemático e racista. Para aqueles que não viram o filme e/ou não estão familiarizados com a história do cinema, no filme os personagens negros são brancos com tinta na cara (o conhecido black face) e há também uma valorização da organização supremacista branca, Ku Klux Klan, considerada a heroína no final do filme.
No documentário Horror Noire – a representação negra no cinema de terror (você pode ler o que escrevi sobre ele aqui) ele demonstra o quanto esse filme foi decisivo para se criar um imaginário de que o povo negro é perigoso. Inclusive, para citar outro filme recente, o “Infiltrado na Klan” de Spike Lee mostra que em uma cerimônia para novos membros da KKK o filme foi assistido e os momentos de chegada da KKK foi celebrado por todos. E há também outros relatos de que esse filme é utilizado na propaganda dos supremacistas.
Esse contexto para chegarmos ao “Estados Unidos vs Billie Holiday”, o filme que conta a história da cantora que foi perseguida pelo governo por causa de uma música.
Óbvio que o motivo alegado não era a música (apesar de todo mundo saber que esse sim era o motivo), os agentes diziam que estavam em uma guerra contra as drogas e que queriam os fornecedores de Holiday. Como a cantora era uma dependente química, o governo se utilizou disso para persegui-la e impedir que ela continuassem com o seu trabalho.
A música que tanto incomodava o governo era “Strange Fruit”, em uma tradução literal “Fruta Estranha” e fala sobre os linchamentos cometidos pelos racistas contra os negros, onde no final, colocavam os corpos pendurados em árvores. Billie comenta que o motivo deles tentarem impedir que ele cante a música é para não lembrar do que eles ainda fazem com os negros. A música é tocante e escutando, entendendo o contexto que ela representa, é muito difícil não ficar emocionado.
Existem muitos debates e reviravoltas no enredo, mas uma coisa não muda: o debate sobre o quanto aquilo que está acontecendo é errado. O governo se utiliza de duas coisas para não só ir contra Billie, como também contra toda a população negra, elas são: a presença de pessoas negras no FBI (mas não com os brancos, o local de trabalho deles é no porão, longe dos olhos incomodados dos brancos) e; a guerra contra as drogas. Motivo alegado até os dias de hoje para justificar atos de atrocidade.
É uma história sobre acontecimentos da primeira metade do século passado, mas algumas coisas ainda estão presentes nos dias atuais.
Filmes que são baseados em fatos históricos sempre me fazem querer ir atrás da história ou do personagem que motivou tudo aquilo. Não conhecia nem a música e nem a história da Billie Holiday, para quem não conhece vou deixar aqui o vídeo dela cantando “Strange Fruit”.