Lembro de uma reflexão no livro “Confissões do Crematório” da Caitlin Doughty sobre o fato de que nós, enquanto sociedade, buscamos a qualquer custo esconder o fato de que vamos morrer. Na verdade, não só buscamos esconder a morte, mas também todo e qualquer vestígio da chegada dela. Seja em quartos de hospital, ou em asilos e casas de repousos.
A reflexão desse livro ficou ecoando em todos os minutos só filme que será o nosso objeto de reflexão hoje, o “Relic” da diretora estreante Natalie Erika James.
O tema do filme não é necessariamente a morte em si, mas flerta muito com ela. Vemos uma família composta por três mulheres, Edna (Robyn Nevin) a avó, Kay (Emily Mortimer) a filha, e Sam (Bella Heathcote) a neta. Kay e Sam foram até a casa de Edna procurar por ela, que havia desaparecido sem deixar nenhum rastro. Edna sofre de uma doença que faz com que ela vá perdendo aos poucos a sua memória e isso preocupa muito as suas filhas.
O filme é de horror, e temos ótimas cenas e que fazem jus ao gênero em que ele se inscreve. Funciona muito bem todos os mecanismos e linguagens que nos fazem ficar aflitos e sentir medo com as situações em que aquelas personagens se encontram.
Não só sentimos medo pelas personagens, sentimos também amor e compaixão por toda aquela situação. Enquanto vemos todo o drama se desenrolar e como elas buscam enfrentar a doença que Edna está passando, vamos nos afeiçoando mais e mais com essa família. E isso faz a sensação da cena final do filme se intensificar ainda mais quando não só enfrentamos a morte de uma das personagens, mas também, de uma certa forma, a de todas elas.
Quando fiz meu “top” pessoal de filmes do último ano e da década, por tudo isso que eu falei aqui, era impossível não colocar “Relic” em uma posição de prestígio. A forma como Natalie Erika James mistura o drama familiar, o enfrentamento de uma doença grave, a morte e o horror é algo admirável e único. É bonito como poucos filmes são.
Materiais adicionais
Texto do Filippo Pitanga – crítico de cinema para a coluna “Cineastas do Mundo Fantástico” publicado no Cinefantasy e depois no Almanaque Virtual
http://almanaquevirtual.com.br/cineastas-do-fantastico-relic-de-natalie-erika-james/
Crítica de Amanda Luvizoto onde ela cruza Relic com a série Dark
http://almanaquevirtual.com.br/um-ensaio-sobre-a-morte-dark-x-relic/
Crítica de Iuri
http://almanaquevirtual.com.br/relic/
Livro citado no começo do texto e publicado pela DarkSide Books
https://www.darksidebooks.com.br/confissoes-do-crematorio/p?uam=true&mobile=4
Texto originalmente publicado na coluna Mundo Fantástico na página do Cinefantasy em 15 de Março de 2021.