Filmes de tribunal não são sobre o lado que está contando a verdade, mas sim sobre quem consegue contar de forma mais convincente e com isso convencer o júri de que a sua versão é a mais próxima da realidade. “Monstro” filme produzido pela Netflix e dirigido por Anthony Mandler conta a história se um jovem negro chamado Steven Harmon (Kelvin Harrison Jr.) que está sendo acusado e sendo julgado por supostamente ter sido vigia em um roubo a uma mercearia e que terminou com a morte do dono.
Essa ideia das diferentes versões do acontecimento, muito comum em filmes que envolvem julgamentos, é evidenciada quando o professor de Steven fala sobre o clássico de Akira Kurosawa “Rashomon” e explica que cada um dos personagens do filme fala sobre sua versão da história e que pouca importa qual é a verdadeira e sim quem consegue convencer melhor. Ele também traz a ideia do filme para a realidade deles, dizendo que em todas as situações quando perguntado para quem esteve presente haveria diferentes pontos de vistas.
Existe, além da ideia das diferentes versões, um debate sobre as questões raciais. As primeiras considerações da acusação dizem com todas as palavras de que aqueles corpos ali sentados não são pessoas, não são humanos, são monstros e devem ser julgados como tais. A defesa luta para que as pessoas que compõe o júri olhem para os acusados como seres humanos.
A ideia de que um júri seja imparcial é algo impossível, todas as opiniões das pessoas são baseadas em suas vivências e experiências e influência dessas experiências em suas vidas. Por isso, a advogada de defesa deixa claro que Steven precisa fazer um grande esforço, pois ele já entra como culpado e precisa provar o contrário (o que demonstra a inversão da ideia de “inocentes até que prove o contrário”).
O grande problema do filme está aí. Ele não avança na discussão sobre a criação e perpetuação do imaginário de que aquelas pessoas, de que aqueles corpos em específico serem considerados monstros na sociedade. Não avança na estrutura, ele não avança nas questões do quanto algumas formas de identificação que geram prisões são falhas, não avança em nada disso. Apenas se foca na ideia das “versões” e isso acaba esvaziando totalmente o sentido da obra.
O filme acaba mostrando a verdadeira versão da história, ou seja, o que realmente aconteceu e isso termina de esvaziar completamente o que chamou toda a atenção do espectador, não há discussão sobre as questões raciais que levaram aquele jovem a prisão. O resultado do júri pouco importa, os traumas foram causados e acompanharão os envolvidos por toda a vida.