Para mim o gênero do horror é o que melhor lida com as questões humanas. Não há outra forma de se fazer cinema, a meu ver, que consiga adentrar nas particularidades, nos anseios, nos medos e nas dores humanas do que o cinema de terror. Não é algo de hoje, já que o gênero em seus mais diversos filmes já abordaram inúmeras questões durante toda a história do cinema, os filmes slasher lidam com uma juventude que utiliza as drogas e o sexo para se divertir, e o horror aparece como uma forma de punição, a ideia de final girl que normalmente é a menina que não se encaixa naquele grupo e normalmente é a que sobrevive no final. Temos Eles Vivem de John Carpenter que é um conto visual sobre o consumismo da sociedade dos anos 1980. Nos dias atuais podemos pensar em filmes como Corra! de Jordan Peele ou Midsommar de Ari Aster que, cada um a sua maneira, discute as questões sociais em voga nos anos atuais – o racismo, o relacionamento abusivo. Enfim, o gênero desde sempre discutiu de forma exemplar os mais diversos assuntos das relações humanas.
E um dos assuntos que ronda a cabeça da humanidade e, consequentemente, dos filmes é o luto. Como lidar com a morte de uma pessoa próxima? Não há uma única resposta correta para está pergunta, mas diversos são os filmes que já lidaram com essa questão, M3GAN de Gerard Johnstone é um destes. No filme vemos Cady (Violet McGraw) que acaba de passar pela morte de seus pais em um acidente de carro. Depois de sair do hospital ela vai morar com sua tia, Gemma (Allison Williams) que trabalha como desenvolvedora de brinquedos inteligentes.
Aqui temos um primeiro choque entre as duas personagens, afinal, ambas estão passando pelo luto. Gemma, está passando pelo luto da irmã e pela novidade de ter que cuidar da sua sobrinha que, é uma criança que acabou de perder seus pais. Como ela não tem uma prática e um costume de conviver com crianças ela acaba tendo dificuldade em lidar com tudo isso. Para tentar remediar a situação e conseguir atingir seus objetivos no trabalho, ela se empenha em criar um brinquedo que ajude a sua sobrinha a passar pelo luto e assim, ajude também a desafogar as suas próprias responsabilidades.
E assim o filme se desenrola, M3GAN (Amie Donald e Jenna Davis) é uma boneca inteligente que vai se desenvolvendo e se aperfeiçoando conforme o tempo. Mas isso acaba se transformando em uma coisa ruim, M3GAN cria uma espécie de um instinto de sobrevivência próprio e de proteção de Cady de forma violenta, fazendo com que ela comece a cometer assassinatos com o intuito de proteger a sua existência e a integridade da criança.
Em linhas gerais, vamos observando como as duas personagens vão superando os traumas provenientes do luto, entendendo o quanto as relações humanas não podem ser substituídas por outras relações, como por exemplo, a relação do ser humana com as maquinas e as tecnologias em geral. Alias, no decorrer do filme vamos observando como as relações vão se desgastando por conta do apego que a criança tem com o seu brinquedo. Ela acaba direcionando sua dor, seu carinho, seus sentimentos para a boneca pois não encontra em outro ser humano um lugar seguro para se sentir segura o bastante para expressar tudo o que sente.
Tudo isso acontece com as cenas habituais do cinema do horror, ou seja, com mortes, danças bizarras e lutas entre o bem e o mal que faz nosso coração se acelerar um pouco. Mostrando o quanto o gênero consegue discutir os mais diferentes assuntos utilizando as linguagens e formas típicas do cinema de horror.
M3GAN diverte, reflete e, acima de tudo, entretém por sua simplicidade. É um bom exemplo de que um filme não precisa de questões e ideias mirabolantes para construir um bom filme, uma boa obra pode ser feita com ideias simples e objetivas.