Um dos movimentos mais importantes da história do cinema é o expressionismo alemão. Todo livro ou curso sobre história do cinema, esse movimento é parte fundamental. Afinal, muitos dos filmes que vieram após o expressionismo referenciam o movimento em algum momento, seja na estética, nos temas ou nos cenários.
Antes de falar do “O Gabinete do Dr Caligari”, filme de Robert Wiene e tema da coluna de hoje, voltaremos um pouco e falaremos do que estava acontecendo com o mundo e que influenciou aquelas obras. O filme de Wiene é de 1920, lembremos que esse período é o imediato pós primeira grande guerra. A Alemanha foi uma potência participativa na guerra e quando acabou sofreu as consequências disso. O expressionismo alemão demonstra a opressão que era viver naquele período. As pinturas dos cenários que oprimem toda e qualquer presença viva denotam qual era a sensação de estar vivendo na Alemanha naqueles anos. Esse era o pano de fundo histórico por trás do expressionismo alemão.
Inclusive, pensar em guerra e cinema nos remete imediatamente a obras que questionam as motivações humanas e nos colocam em lugar de crise. Óbvio que estou falando dos bons filmes de guerra, não aqueles que se colocam como uma torcida. Mas, pensemos no neorrealismo italiano, filmes como a Trilogia da Guerra de Rossellini demonstram o quanto a guerra é um evento nocivo. Já pensando no que acontece com a sociedade em geral no pós guerra e sem sair do neorrealismo podemos citar o clássico “Ladrões de Bicicleta” do Vittorio De Sica, que mostra a Itália tendo que conviver com todos os males e prejuízos causados pela sua participação na segunda grande guerra.
Voltemos então ao Dr Caligari, caso você ainda não tenha visto o filme aqui vai um pequeno resumo: um doutor quer fazer uma apresentação, ele quer mostrar Cesare, um sonâmbulo que dorme há 20 anos e que consegue prever o futuro de quem faz perguntas para ele. Porém, quando ele prevê que uma pessoa irá morrer e isso acontece todo mundo fica angustiado querendo saber o que aconteceu. Acontece que, na verdade, ele prevê a morte de alguém e logo em seguida ele mesmo vai lá e mata a pessoa, fazendo sua profecia ser de fato realizada.
Muita coisa chama atenção e talvez seja dizer o óbvio quando falamos do quanto esse filme é grandioso e consegue nos envolver muito bem nos dias de hoje. Mesmo sendo um filme do período mudo, com cartelas e tudo mais que era típico do cinema feito naquela época, você consegue assisti-lo tranquilamente nos dias de hoje, sem olhar no relógio ou no celular para saber quanto tempo passou. Entra naquela categoria de filmes que são atemporais e históricos, atemporal pois conseguimos assistir em qualquer ano que ele ainda será um bom filme. Histórico por demonstrar um sentimento vigente naquela época e para aquelas pessoas.
Cabe também comentar aqui o quão magnífica é a cena em que o Dr Caligari acorda Cesari. Filmando apenas o rosto e vemos os olhos se abrindo, dá um arrepio apenas de lembrar e de pensar o quanto essa cena foi importante para o cinema de horror, o quanto esse despertar já foi utilizado. É incrível.
Podemos chamar de spoiler contar o final de um filme como “O Gabinete do Dr Caligari”? Lançado em 1920? Não sei dizer, vou evitar por bem e comentar o final apenas por cima. Ele consegue nos colocar em uma situação inteligentíssima, nos fazendo duvidar de tudo aquilo que vimos e vemos.
Para aqueles que ainda não viram o filme, ele está disponível em vários streamings e também no próprio YouTube. Seja onde for, veja o filme uma parte importante da história do cinema, do horror e do fantástico com os seus próprios olhos.
Texto originalmente publicado na coluna Mundo Fantástico na página do Cinefantasy em 16 de Agosto de 2021