Normalmente gosto de filmes de tribunais, gosto de ver como se desenrolam as argumentações e a narrativa que nada ou pouco tem relação com a verdade, mas sim com a ideia de convencimento de um grupo de pessoas sobre a inocência ou a culpa de uma pessoa. No entanto, o novo filme de Clint Eastwood vai em outra direção, o ponto principal da história é a verdade. Pouco importam as argumentações sobre o caso em questão.
Justin (Nicholas Hoult) vai participar de um júri sobre um crime bárbaro, a morte de uma mulher por seu namorado. Acontece que Justin pode ter sido o responsável pela morte e não o namorado. E aí entramos no dilema: contar a verdade e ser preso, ou participar do julgamento para que consiga escapar de se responsabilizar pelos seus atos.
Como eu disse lá no primeiro paragrafo, as argumentações pouco importam aqui. Tanto que os advogados, interpretados por Toni Collette e Chris Messina acabam não tendo a importância que os dois principais advogados em um filme de tribunal tem. A primeira parte do filme em que as argumentações dos dois são colocadas para o júri são rápidas e não há muita importância colocada ali no que se fala ou se mostra. O ponto central são as reações que Justin, a forma como ele se recorda daquela noite e tudo mais. Portanto, não é relevante o que se diz ali, o importante é o quanto sabem da participação de Justin e se há a possibilidade dele ser incriminado. E tudo isso se intensifica com o fato de que a sua mulher, Allison (Zoey Deutch) está grávida.
O que temos durante todo o filme são os dilemas morais. Jurados que precisam dar conta da própria vida, mas por conta das suas obrigações enquanto cidadãos estadunidenses, são obrigados a participar do júri e querem acabar com aquilo logo para poderem voltar para suas responsabilidades, mesmo que isso signifique que tenha que condenar uma pessoa a prisão. E temos Justin, que não consegue escolher entre se salvar e conviver com a sua família, ou salvar um homem inocente.
Durante todo o filme não vemos uma pessoa sendo julgada por um júri, ou tendo sua vida revirada por conta de um evento, mas sim os personagens sendo julgados pela verdade. Sempre que uma nova informação é revelada vemos o rosto de Justin, como se tivesse sendo confrontado a todo momento.
Não só Justin, mas a própria personagem de Toni Colletti é colocada nessa posição. Ela tem a sua função de promotora, tem uma eleição para vencer, mas começa a questionar se ela está de fato seguindo a justiça condenando aquele homem.
Clint Eastwood realiza um filme filosófico, confrontando os seus personagens com a suas próprias convicções de moral e ética. Até que ponto as convicções sobrevivem ao critério da verdade? Como as versões que idealizam de si próprios devem agir diante dos dilemas? Tudo isso pode ser encontrado dentro do filme de Clint.
Além, é claro, de se confrontar todas as questões éticas e morais estadunidenses do próprio sistema. Ou seja, até que ponto o sistema de justiça daquele país é de fato justo? Não são poucas as vezes em que vemos os personagens sendo julgados pela estátua da justiça ou frases que representam a integridade daquele sistema. É como se houvesse uma contradição entre o que está acontecendo e a simbologia daquele lugar. As convicções não se sustentam diante da verdade. O sistema não se sustenta diante da verdade.
Jurado N°2 é um filme conciso no sentido de ter um inicio, meio e fim bem delimitado, e um filme forte. Mostra que Clint continua um grande contador de histórias, que consegue nos fazer refletir sobre temas que estão além da história por conta das imagens que constrói e pelas suas escolhas narrativas. Uma pena que um filme como esse não possa ser visto em uma tela grande de cinema, mas que sorte temos de ao menos podermos assisti-lo. Viva Clint Eastwood.