Para qualquer cinefilo um filme que fale sobre a história do cinema é um misto de emoção. De um lado sentimos uma certa sensação de nostalgia proporcionado pelas referências a obra que reconhecemos e situações que já estudamos. De outro – e aqui estou falando de mim particularmente – fico pensando muito nas escolhas que os autores e autoras fazem quando estão contando uma história deste tipo. O que eles deixaram de lado? Quais pessoas importantes para o cinema que não foram citadas? O que nesse filme deveria ter tido mais tempo, devido a sua importância? Enfim, são muitas as questões que rodeiam minha cabeça quando vejo um filme que retrata algum momento da história do cinema.
Existem também mais dois problemas que eu observo em filmes com o tema “história do cinema”: normalmente parece dar uma falsa sensação de que a história do cinema teve impacto somente de uma parte da indústria (na maioria dos casos a norte-americana), sendo todas as maiores invenções, experiências, quebras de paradigmas entre outros surgido lá e; o erro de ficar somente observando os eventos ali, se embebedando com as referências e não procurar analisar de que forma elas foram colocadas ali naquele filme e se funcionam.
“Babilônia”, novo filme de Damien Chazelle que antes fez dois filmes que eu tenho simpatia – “La La Land: Cantando Estações” e “Whiplash: Em Busca da Perfeição” -, tem como tema Hollywood e como alguns personagens ali sentiram as diversas mudanças que a arte vinha passando, sobretudo dos anos 20/30 com a implementação do som no cinema.
Vemos esses eventos acontecendo como se estivéssemos ali, junto com as personagens, no meio de suas turbulentas vidas. O foco nunca é a mudança da arte, sempre estamos observando uma situação e, no plano de fundo daquela história, vemos o desenrolar da evolução da linguagem. Por exemplo, em um momento de tensão entre as figuras centrais do filme acontece o lançamento do filme “O Cantor de Jazz” primeiro filme com a sincronização de som das falas dos personagens. Ou seja, vemos se desenrolar uma situação própria dos conflitos dos personagens do filme e, aquela situação se passa em um momento importante da história do cinema.
Esse talvez seja um dos grandes acertos de Chazelle, ele coloca as pessoas e as suas relações como pontos centrais na sua história, mesmo que esteja também acontecendo outras coisas importantes, as pessoas ainda assim são o elemento mais importante de tudo isso.
Mas o filme se perde em outros momentos. Ele é bem longo, tem cerca de três horas de duração, e como não utiliza as elipses de uma forma dinâmica me senti preso em alguns momentos e largado em outros. Me parece que ele privilegiou e prolongou o tempo de situações que não eram tão relevantes assim para a história, enquanto corre e corta outras que poderiam contribuir para desenvolver ainda mais aquelas pessoas que estamos acompanhando. Uma das escolhas mais equivocadas do filme é quando ele mostra o vício de Nellie LaRoy (Margot Robbie) com apostas, há uma citação que logo já pula pra consequência. Não existe um desenvolvimento, só existe a uma menção e a consequência daqueles atos, mesmo que aquilo envolva personagens extremamente interessantes.
Inclusive, o filme inteiro tem personagens que todos queríamos saber mais – e talvez essa seja a vontade do diretor, de nos fazer querer mais e mais de quem estamos vendo -, só que as relações simplesmente não são desenvolvidas. Elas estão ali, ficam por um tempo e depois vão embora. Até mesmo um dos personagens mais interessantes e teoricamente importantes para a história, como Sidney Palmer (Jovan Adepo), não tem o tratamento que merece no filme, deixando um enorme incômodo, pois ali havia diversas discussões que poderiam ter sido levantadas, inclusive sobre as contribuições de pessoas não brancas no cinema, e simplesmente foi deixado de lado.
O filme se chama “Babilônia” para demonstrar o quanto de “degeneração moral” existia naquela sociedade e naquele período. Mas não há discussões sobre isso, o que leva aquelas pessoas a se comportarem daquela forma? De que forma isso influência na vida daquelas personagens? O que aquela degeneração tem haver com o cinema? Não há nada, simplesmente está ali por estar. Colegas da crítica falaram sobre o excesso, de que esse filme se utiliza do excesso em tudo que se propõe. Mas na verdade o filme erra mais na falta do que no que excede. Aliás, o excesso pode ser uma forma do cinema muito bem utilizada – os cineastas de horror sabem muito bem fazer isso -, o que infelizmente não é o caso do filme e nem da direção de Damien Chazelle, uma pena.