Uma das coisas que eu li sobre “Triângulo da Tristeza” de Ruben Östlund quando ele ganhou a Palma de Ouro em Cannes em 2022 foi de que talvez estivéssemos diante de um “novo Parasita”. A princípio isso me incomodou, mesmo entendendo que uma das formas da crítica de cinema é a de fazer correlações entre os filmes, comparando-os, refletindo sobre a aproximação sobre ele. No entanto, pelo que eu sabia do filme, não havia tanta semelhança assim entre uma obra e outra.
Depois que finalmente consegui assistir ao filme eu percebi que a semelhança está mais nos “olhos de quem vê” do que de fato na obra de Ruben Östlund. Obvio, há a ideia de uma sociedade extremamente rica ali no filme e que vive totalmente alienada do mundo real, mas as semelhanças para por aí.
Por outro lado eu entendo que “Parasita” de Bong Joon-ho seja uma obra incrível e praticamente a única que ganhou o Oscar e continua com relevância (isso é assunto para um outro texto), mas não enxerguei tanta semelhança entre uma obra e outra, pelos temas serem diferentes e, claro, o valor que “Parasita” tem enquanto obra – forma, conteúdo e extracampo – é totalmente outro.
“Triângulo da Tristeza” tem como tema essa sociedade hipócrita e glamourizada da classe extremamente rica. No filme vemos as mais diferentes contradições, desde um amor que existe, só que o seu valor está mais por conta do engajamento das redes sociais do que do sentimento em si. Há também aquele casal de velhinhos fofos, mas que descobrimos serem orgulhosamente os donos e participantes efetivos da indústria do armamento, que fala com amor de que seu negócio “garante a democracia no mundo”.
Todas essas pessoas estão dentro de um luxouso cruzeiro e vamos observando as máscaras sendo retiradas uma a uma com as relações que eles vão tendo com os outros passageiros e os tripulantes do navio.
Há muito de contradições entre o “belo” e o “feio” no filme. Ao mesmo tempo em que vemos superficialidades bonitas, ao adentrarmos no que são realmente aquelas personagens, entendemos que elas são mais podres do que comida estragada. Aliás, o que mais se falou sobre o filme (pelo menos o que chegou em mim) foi o de como ele coloca essa parte “feia” da sociedade altamente rica para fora – do corpo, literalmente.
Também existe uma tentativa de mostrar as contradições nos empregados do navio, com eles sendo em parte totalmente fiéis aos passageiros, mesmo quando o que eles pedem são coisas totalmente sem sentido e servem somente para atender seus caprichos totalmente sem sentido. E talvez a parte mais interessante é o debate entre o marxista Capitão de um navio (americano) e o porco-capitalista (russo) e que viveu no período da URSS.
E o final do filme é talvez o momento em que as pessoas enxergam a semelhança com o “Parasita”, que é quando as coisas se invertem. Mas de novo: essa semelhança está ali mais para quem QUER ver do que no filme em si.
Para ser sincero, não achei o filme tão interessante assim quanto alguns dos meus colegas. Talvez – e me parece que seja este o caso – o filme seja só mais um daqueles que vemos com anseio na época de premiações e depois esquecemos completamente a sua existência. Não gosto disso de tentar prever o futuro de uma obra, principalmente por entender que o nosso olhar sobre um filme sempre se modifica, mas não há nada nesse filme que me parece ser de tanto valor assim para discutirmos mais sobre ele e se levarmos em consideração a história da grande maioria dos últimos indicados ao Oscar e outras premiações anuais, a tendência é o esquecimento e até a total irrelevância. Aguardemos o que o tempo vai fazer e nos dizer sobre este filme.