Confesso que as narrativas shakespearianas não são, nem de perto, as minhas preferidas no cinema. Nem das adaptações antigas feitas por grandes cineastas do passado, como o caso do filme “Macbeth” de Orson Welles. Admito que acho estranho essa minha “rejeição” à esse tipo de narrativa, já que gosto das discussões que podem ser levantadas através das adaptações de Shakespeare.
Mesmo com essa minha ressalva de gosto pessoal decidi assistir ao novo filme de Joel Coen, “A Tragédia de Macbeth“. Muito, confesso, graças a presença de Denzel Washington e Frances McDormand no elenco. E também pela estética preto e branco que o trailer já anunciava. A história é a mesma de sempre: vemos Macbeth movido por uma previsão de uma bruxa sobre o seu destino, que ele iria ser rei. Depois de contar para sua esposa, ela logo começa a influenciar para que essa previsão se cumpra o mais rápido possivel, mesmo que para isso, Macbeth tenha que assassinar o atual rei.
Talvez o mais rico desta nova adaptação seja como as duvidas de Macbeth foram transplantadas e encenadas por Denzel Washington. Olhamos no seu semblante o quanto ele está com dúvidas e a sua luta interna para saber o que irá fazer. Terá coragem de cometer tal ato? Pensa em desistir? Algo o aflige? Tudo está nitidamente estampado em seu rosto. Assim como a personagem de Frances McDormand afirma em um dos diálogos do filme: o rosto de Macbeth é um livro aberto.
Essa duvida exposta no rosto de Denzel me fez refletir um pouco sobre a previsão da bruxa, que parece ser aquele tipo de visão do futuro que depende que o protagonista saiba do seu futuro e por saber dele se vê impelido a agir. Explico: Macbeth tinha não só uma devoção muito forte, mas um laço de amizade com o rei. Suas ações com ele eram sempre baseadas na lealdade que um tinha com o outro. Teria, então, Macbeth decidido assassinar o rei e tomar o seu trono caso a bruxa não o tivesse dito o seu destino? Provavelmente não. A realização desta profecia depende única e exclusivamente do saber dela.
Algo que corrobora isto é o fato de que sem saber da profecia, Frances McDormand, que interpreta a esposa de Macbeth, nunca teria o influenciado a cometer tal atrocidade e nem teria ajudado e “sujado” as suas mãos para tornar Macbeth um rei. Todas as ações dos dois derivam de uma única coisa: o saber.
Macbeth não fica muito tempo na posição de rei. Afinal, a profecia da bruxa dizia também que o filho de Banquo (Bertie Carvel) seria rei. Todas essas profecias geram outros assassinatos e outras intrigas para ou manter o poder na mão de uma pessoa, ou tira-lo. A presença de Macduff (Corey Hawkins) também é algo a se destacar aqui, pois, através de sua vingança ele dá inicio ao que a profecia dizia por ultimo (mas, neste caso, ele não age por saber da profecia e sim para se vingar das atrocidades cometidas por Macbeth).
“A Tragédia de Macbeth” de Coen é um filme esteticamente bonito e absolutamente reflexivo. Cheio de monólogos sobre a vida, o destino, e as consequências das ações. No meio disso tudo, o filme lida com questões de culpa e da loucura – originada da culpa -, além, é claro, de tratar das ambições e dos caminhos tortuosos para alcança-la.
Reafirmo: não sou grande fã de narrativas shakespearianas, mas creio ser muito difícil não gostar deste trabalho de Joel Coen.