Gosto de acompanhar a trajetória do cineasta Matheus Marchetti, seus filmes sempre me provocam e me animam com o futuro do cinema brasileiro. Gosto de como ele reimaginou a sua maneira os vampiros e a mitologia dos fantasmas. Neste seu novo filme ele mergulha no universo criado pela literatura de Edgar Allan Poe para criar as suas imagens.
Vale lembrar que este empreendimento visual não é incomum, as histórias de Edgar Allan Poe já foram levadas para o cinema por vários cineastas, destacando os que mais gosto, o filme de Jean Epstein e o famoso ciclo de Roger Corman. Sendo assim, a tarefa de Matheus me parece ser mais difícil por se tratar de um assunto já tratado por diferentes, talentosos e fundamentais cineastas.
O fato de um filme ou uma história já ter sido contada antes só é um problema para quem não tem criatividade. E, como podemos confirmar por seus filmes, Matheus Marchetti é um cineasta que possui uma grande criatividade para criar e contar histórias. Neste caso, ele consegue imprimir sua visão de cinema aos contos de Poe. Vemos ali não só as referências aos contos e filmes antigos adaptando as histórias de Edgar Allan Poe, mas a própria assinatura de Matheus. Não tem imagens que existem apenas para referenciar algo, as imagens fazem parte de um conjunto muito peculiar do trabalho que o diretor vem fazendo ao longo de sua trajetória.
Há cores intensas e a sensualidade comum a obra de Matheus. Tudo isso se misturando a belíssimas imagens de horror, que em determinado momento se mistura com músicas e consequentes números músicas. É como um sonho, que ao em um momento parece ser concreto como a realidade e em piscar de olhos vira um delírio em que só vamos acompanhando os acontecimentos como espectadores inertes.
Preciso dizer também que podemos ver o Brasil dentro de uma história de Edgar Allan Poe. Temos um ator mirim que entra em decadência, nomes que remetem a nossa cultura e imagens que encontramos ao viramos as esquinas da rua da nossa casa. Não é um filme gravado e pensado para fora. É um filme brasileiro em todos os aspectos e sentidos.
Apenas para não deixar de dar uma pequena sinopse aqui do que se trata a história: vemos Rodrigo Escher (Bruno Germano) é entrevistado por conta de sua história como ator mirim famoso, a partir daí ele começa a contar as histórias de sua família e das suas condições mentais. Ele conta essa história enquanto está pintando um retrato do entrevistador, Vicente (Natan Cardoso). Um conhecedor de Edgar Allan Poe já consegue identificar elementos de seus contos nesse pequeno resumo da história.
O filme conta também com as atuações de Tuna Dwek, Anna Preto e Vinícius Précoma, todas essas pessoas contribuindo muito bem, cada uma a sua maneira, com atmosfera de delírio, sensualidade e horror que o filme de Matheus Marchetti tem.
O Solar dos Prazeres Noturnos é um curta que demonstra a habilidade do diretor e da sua equipe de adaptar uma história conhecida, que por conta da sua forma de ver o cinema nos parece inteiramente nova. Matheus Marchetti é um cineasta que deve ser observado sempre que possível. Sua cinefilia e empenho em fazer histórias a sua maneira vem nos trazendo bons filmes. O que aumenta a sua responsabilidade em relação as duas próximas obras, mas que deixa o crítico aqui bem ansioso.